MCTI e Mamirauá captam U$5,6 milhões para restaurar áreas alagáveis na Amazônia
Projeto vai desenvolver técnicas e metodologias, capacitar comunidades locais e tradicionais e prevê recuperar 25,7 mil hectares de áreas de mangues e várzeas
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e o Instituto Mamirauá, organização social da pasta, captaram US$5,6 milhões (cerca de R$ 27 milhões) do Fundo Global do Meio Ambiente (GEF, na sigla em inglês) para desenvolver projeto de restauração de áreas alagáveis na bacia Amazônica. O projeto recebeu aprovação no dia cinco deste mês, durante a reunião do Conselho do fundo, que foi realizada nesta semana em Washington.
“Até o momento, não há protocolo cientificamente embasado para a recuperação de cobertura vegetal de florestas alagáveis. Estamos perdendo os nossos mangues e a riqueza da biodiversidade neles presentes. Vamos construir os protocolos para recuperá-los e de início restaurar 25 mil hectares”, destacou a secretária de Políticas e Programas Estratégicos do MCTI, Marcia Barbosa.
O projeto “Restauração de Áreas Alagáveis e outros importantes Ecossistemas Amazônicos – Capacitação, inovação, desenvolvimento e transferência tecnológica para restauração ecológica e mitigação da mudança do clima” terá duração de 60 meses e pretende restaurar 25,7 mil hectares. A iniciativa deve evitar a emissão de 10 milhões de toneladas de CO2 e gerar benefícios diretos para cerca de 1,6 mil pessoas de comunidades locais tradicionais e indígenas.
As áreas alagáveis representam cerca de 11% da bacia Amazônica, que abrange cerca de 7,5 milhões de km2, incluindo a área internacional. Isso significa que cerca de 825 mil km2 são mangues, que têm ciclo de inundação diária, ou várzeas, também chamadas de planícies alagáveis, onde o ciclo de inundação é anual e pode chegar a mais de dez metros. Só na Amazônia Central, essa área chega a 300 mil km2, uma área equivalente ao território da Itália.
“É uma área muito rica, com alta produtividade primária, que significa riqueza de recursos naturais, como plantas e algas, que são procurados por diferentes espécies animais para alimentação”, explica Emiliano Ramalho, responsável pelo projeto e diretor técnico-científico do Mamirauá. Estima-se que 50% das espécies de peixes na Amazônia ocorrem nesses sistemas alagáveis.
As áreas alagáveis são ecossistemas críticos que oferecem serviços ecossistêmicos essenciais, como filtragem e retenção de água e sedimentos, recarregam aquíferos, regulam microclima e são importantes reservas de carbono. No mundo, cerca de 90% dessas áreas foram perdidas e continuam a desaparecer.
A proposta do projeto é contribuir com conhecimento e tecnologia para suprir uma lacuna sobre restauração florestal no Brasil. “Há uma lacuna na restauração de áreas alagadas. Há algumas iniciativas, mas não um projeto com essa amplitude”, avalia Ramalho.
Por isso, o primeiro passo será produzir um planejamento claro e objetivo de restauração para os ambientes amazônicos alagáveis. “O Plano Nacional [para Restauração da Vegetação Nativa – Planaveg] tem diretrizes, mas não informa o que fazer e como fazer para recuperar essas áreas, que formam uma parte da Amazônia que merece atenção especial”, explica Ramalho.
Ao mesmo tempo, o projeto vai desenvolver metodologias e técnicas para suprir uma das principais deficiências que envolvem o assunto: capacidades técnicas para executar a restauração em áreas alagáveis. De acordo com o responsável, o projeto vai criar um programa de capacitação, com cursos técnicos, direcionado para comunidades locais tradicionais e indígenas, técnicos municipais, estaduais e federais que atuam na área e microempreendedores da região. “A ideia é que as pessoas sejam capacitadas com técnicas sobre como coletar sementes, armazenar, plantar e comercializar, como se relacionar com outros empreendedores”, exemplifica.
As ações de restauração estão diretamente relacionadas com a promoção das cadeias da bioeconomia, que fomentam o desenvolvimento sustentável aliado à conservação ambiental. “O projeto toca de maneira muito clara nesse ponto. Não é só restaurar, mas tornar o ambiente propício para desenvolver”, analisa Ramalho. Primordialmente, a restauração envolve o ponto de vista de biodiversidade e clima, mas também pode ser um fio condutor do desenvolvimento local, que gera receita.
O projeto deverá entregar modelos replicáveis para disseminar métodos para restauração ambiental. Por isso, o conjunto de ações será implementado em três áreas protegidas. Inicialmente estão previstos pontos no estuário da Amazônia e seus mangues, localizado na costa do Pará, entre Tracuateuá e Gurupi-Piriá; e na Amazônia Central em pontos do Rio Negro e no Médio Solimões. As áreas exatas ainda serão definidas, mas deverá contemplar ambientes de mangue, várzea e terra firme. “Vamos usar a restauração no âmbito do projeto para treinar as pessoas e a partir das experiências da restauração nortear a estratégias e metodologias”, diz.
Nesse processo, a experiência de 25 anos do Mamirauá em trabalhar com comunidades locais aliado ao conteúdo científico será um aspecto relevante. “O Mamirauá nasce com essa proposta de ter interdisciplinaridade nas ações e sempre preocupado em ter conteúdo científico, criar modelos replicáveis e ter as capacidades técnicas”, relata Ramalho.
A agência implementadora do projeto será a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), que está engajada na Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas.
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